Naquele final de tarde Fernando telefonou para a
mãe perguntando se ela já estava vindo pra casa. De pronto, com certa preocupação,
a voz do outro lado perguntou o que tinha acontecido, se era algo urgente, ao
que o filho respondeu que não era nada demais e apenas queria apresentar-lhe
uma pessoa.
Logo a conversa criou um impasse. O filho
tentando manter o anonimato da tal pessoa e a mãe querendo saber,
antecipadamente, quem era.
– É que eu quero que a senhora conheça uma
pessoa que está aqui em casa. É só isso. Não tem nada urgente, conforme eu
disse antes.
– E eu vou ter uma surpresa?
– Certamente que vai! Você até já viu essa
pessoa, ela já esteve aqui em casa outras vezes e pertence a um grupo de nosso
convívio, embora não tão recente. Mas acho que a senhora vai lembrar.
– Minha nossa. Me diz ao menos como ela é?
– Não, mãe. Qualquer pista que eu der a senhora
vai matar e eu quero ver a sua reação diante dela.
– Como assim? Então eu vou ter uma reação?
– Acho que vai – e deu um risinho abafado pelo
telefone.
– É um namorado, meu filho? É um rapaz que você está
namorando? Olha, isso é bem tranquilo pra mim, sabe? Não tem...
– Não, mãe. Não é um namorado, não. Vem pra casa
e chega de falar enquanto dirige. Vem logo!
A mãe passou na padaria perto de casa e comprou
uma torta salgada, escolheu um vinho branco e um refrigerante, um chocolate
básico e foi apressada pra casa.
Assim que abriu a porta deu de cara com uma
linda menina, na faixa dos mesmos 30 anos do filho. Tinha um belo e volumoso
cabelo crespo e ruivo, uma sobrancelha bem desenhada emoldurando uma fisionomia
angelical e, com suas mãos de fada, segurava a mão do Fernando, um tanto
nervosa.
Os dois, sentados no sofá, logo se levantaram e
foram abraçar a recém-chegada. Depois ajudaram a arrumar as coisas do lanche na
cozinha e então ele começou.
– A senhora lembra da Camila?
– Sim, agora estou me lembrando. Eu estava pra
dizer que ela não me era estranha. Aí, agora que você falou o nome Camila, eu
tive a certeza. Ela estudou com você lá no colégio da Tijuca, né? Mas vocês
eram muito crianças naquele tempo.
– Eu sabia que você ia lembrar dela. Quase
apostamos isso entre nós.
O lanchinho correu às mil maravilhas e a
surpresa da mãe com a namorada do filho foi enfim melhor que o esperado. A hesitação
do Fernando era porque a mãe sabia que a Camila tinha um filho e ela até
conhecia o pai, pois que o rapaz fazia parte da turminha da escola que,
coincidentemente, muitas vezes se reunia em torno daquela mesma mesa da sala onde
agora conversavam os três. Então, a questão era saber se a mãe estaria
tranquila com toda aquela situação, afinal ela até queria ser avó, mas, digamos,
os planos não eram exatamente aqueles.
No meio da conversa a Camila foi pegar uma foto
do filho pra mostrar. Agora com 11 anos o menino era uma figura. E como foto é
mesmo coisa de mãe, a do Fernando disse um rápido espera aí e foi até o quarto
pra buscar também umas fotos antigas, mostrando que em um dos aniversários da
turma ela havia tirado uma foto junto com a criança.
– Olha essa aqui e veja se não é o próprio Totico
no meu colo?
– É verdade. É ele mesmo. – disse o casal em
coro.
Naquela noite, antes de dormir, quando a mãe
veio dar boa noite, o filho deu-lhe um beijo e pegando na sua mão disse:
– Obrigado, viu?
– Que nada. Eu adoro a Camila. Não só a Camila
como o menino Totico. E depois vocês tem uma história juntos, se conhecem desde
o colégio e ainda...
– Não é só por isso que eu tô agradecendo, mãe.
– Como assim, o que eu fiz?
– Você perguntou se eu estava namorando um
rapaz, lembra? É isso que eu estou agradecendo. Pelo seu respeito, por sua
aceitação, pelo seu amor. Isso foi muito legal. A minha liberdade. A sua generosidade.
Eita nós. Taí uma mãe de cabeça aberta!
E os dois se abraçaram como se fosse uma dança,
uma despedida daquele dia especial. Um dia de paz e de compreensão.
O mundo parece estar caminhando numa direção bem
bacana.
Que pena eu sinto do Brasil.